domingo, 10 de janeiro de 2010

O descobrimento do Pré-sal


Cinco décadas de investimentos e monopólio e, nos últimos 30 anos, a Petrobrás acreditou numa nova concepção de jazida, diferente das convencionais que a gente possuía. E durante esses 30 anos ela não pôde explorar essa jazida porque tinha uma camada de sal de mais ou menos dois quilômetros de espessura, que perturbava o levantamento sísmico limitado a duas dimensões. Quando veio a evolução tecnológica, com a sísmica de três e quatro dimensões, a Petrobrás, finalmente, pôde atingir o objetivo com mais precisão e consolidar aquilo que imaginava que fosse uma enorme província abaixo da camada de sal. E tanto foi necessária essa cautela que o primeiro poço, o poço descobridor da província, custou U$ 260 milhões. Por quê? Porque tivemos surpresas. A camada de sal não é uma rocha rígida, ela é gelatinosa. Quando se tinha que trocar a broca de tempos em tempos, às vezes seguidamente durante o dia, dependendo da dureza que se encontra na rocha, cada vez que se retirava a coluna, a camada de sal fechava o poço. A Petrobrás teve que revestir o poço, com uma tubulação de aço, o que leva um tempo maior. Então, o primeiro poço levou um ano para ser perfurado e custou US$ 260 milhões. Hoje, a perfuração está custando mais ou menos U$ 60 milhões e não se pode baixar muito, porque há um tempo mínimo de perfuração e uma plataforma nessa profundidade, com essa especialização, está custando U$ 600 mil por dia. Uma forma de baixar o custo seria construir novas plataformas.

Como é que é o mecanismo de formação do petróleo? Os rios trazem material orgânico, depositam no fundo do mar, junto com areia, pedras, diversos materiais e, com a pressão da coluna d’água, esses matérias formam uma rocha mista porosa, com o material orgânico no seu interior. Esse material orgânico durante milhões de anos é fermentado por micro-organismos. E esses micro-organismos atuam na rocha geradora onde estão depositados esses materiais e transformam esse material orgânico em petróleo.

Quando o petróleo amadurece, a pressão dentro dessa rocha geradora atinge um valor elevado de 5 mil libras ou até de 10 mil libras, a temperatura se eleva e a rocha se rompe deixando escapar o petróleo gerado dentro dela. Aí esse petróleo caminha para a superfície por diversos caminhos e se perde, mas se em alguma parte esse petróleo encontra uma rocha porosa que o armazene ai está formado um reservatório convencional.

Qual a diferença para a jazida do pré-sal? Da mesma maneira o material orgânico foi depositado no fundo do mar e também durante milhões de anos foi fermentado. Mas tem uma diferença fundamental. Quando os continentes sulamericano e africano co-

meçaram a se separar, o mar penetrou na fenda entre eles e ficou confinado, não tendo movimento lateral de correntes e ondas. O mar ficando confinado só tinha a elevação com a elevação da maré. Aí houve uma evaporação muito grande da água do mar e uma concentração de sal, que desceu e se depositou em cima desse material orgânico ali depositado. Essa camada de sal, que atingiu uma espessura de dois quilômetros, teve duas vantagens fundamentais: se depositou em cima dessa rocha geradora e protegeu-a mecanicamente e selou-a, de tal forma que, quando o petróleo se formou, amadurecendo o material orgânico fermentado pelos Phitoplanctos (micro-organismos), a pressão subiu e não houve o rompimento da rocha geradora, portanto não houve perdas. Então o petróleo formado está todo lá, na própria rocha geradora. Essa é a diferença de reservatório do pré-sal e do convencional, gerando duas vantagens do pré-sal sobre uma jazida convencional. A primeira é que todo material orgânico se transformou em petróleo e ficou retido no reservatório, a própria rocha geradora. Segunda: em um reservatório convencional, as bactérias comem o petróleo leve e deixam o petróleo pesado, de pior qualidade. No pré-sal, as bactérias não tiveram acesso porque o sal não deixou. Ou seja, o sal protegeu não só mecanicamente como biologicamente, uma vez que não deixou as bactérias daninhas comerem o petróleo leve. Então, o petróleo do pré-sal é muito melhor do que o nosso petróleo convencional. É um petróleo muito melhor do que, por exemplo, Marlim ou Albacora. Eles têm um grau API em torno de 15 e 16, significa óleo pesado, e o pré-sal tem de 28 a 34. Quanto mais alto o grau, mais leve e melhor qualidade tem o petróleo. Com isso, os técnicos da Petrobrás, a partir do primeiro furo, tiveram comprovada aquela teoria estudada durante 30 anos e tiveram a alegria de ter, em 11 poços perfurados, encontrado petróleo em 11, confirmando as expectativas. Em função de várias razões como especulações na Bolsa e a revisão por grupo interministerial do marco regulatório, a Petrobrás e o Ministério das Minas e Energia não podem falar muito sobre o pré-sal. Então sobra para a Aepet falar sobre o assunto por todo o País. As estimativas, conservadoras, dos geólogos da Petrobrás sobre a reserva esperada chegam a, pelo menos, 90 bilhões de barris de petróleo. Há, entretanto, a perspectiva de se chegar a 300 bilhões, mas não vamos raciocinar com essa hipótese, vamos ficar apenas nos 90, que já vamos ter “problemas” suficientes.

Os primeiros problemas são os blocos que a Petrobrás comprou associada, infelizmente, a empresas estrangeiras. A Exxon comprou um bloco no segundo leilão junto com a Petrobrás. A Exxon tem 40%, a Petrobrás tem 20% e a americana Amerada Hess tem 40%. Ela esperou a Petrobrás fazer 11 furos para fazer o poço dela, para não ter risco nenhum. Enfim, a Petrobrás furou todos os seus poços e já encontrou petróleo. Quando perfurou, achou e testou o bloco de Tupi, foi falar com o presidente Lula sobre a magnitude dessa descoberta e aí o presidente se assustou, corretamente, porque o atual marco regulatório é muito desfavorável ao Brasil. Então, o presidente Lula mandou retirar 41 blocos do pré-sal que estavam incluídos no 9º leilão da ANP, porque se transformaram em bilhetes premiados. Porque a atual lei do petróleo foi feita para incentivar a vinda de empresas estrangeiras para investirem em áreas ainda não descobertas, correndo riscos. No pré-sal não tem mais risco. Já está descoberto Normalmente, numa pesquisa desse porte, o índice de sucesso de 10% é muito bom.

Fura 10 poços e acha 1, fica satisfeito. Agora, você fura 11 e acha em 11, não tem mais risco. Então a Lei atual, a 9478/97, não se aplica ao pré-sal.

A primeira estimativa da província é de que ela vai de Santa Catarina até o Espírito Santo, mais ou menos com 800 km de extensão, por 200 km de largura, em média.

A Petrobrás furou o poço no bloco BMS-11, descobriu Tupi, depois descobriu Júpiter, depois descobriu Iara, Carioca, Parati, enfim, perfurou e achou petróleo em todos esses blocos. E em 1º de maio deste, a Petrobrás colocou em produção o poço descobridor do pré-sal, de Tupi, e já havia colocado o de Jubarte, no Espírito Santo, mais raso, que estão produzindo, cada um, em torno de 10 mil barris ao dia. Esses poços são componentes de Testes de Longa Duração. Durante um ano e meio a Petrobrás coloca em produção esses poços e estuda as características dos dois reservatórios, física, química, biológica, enfim, todos os dados necessários aos projetos de produção definitivos, inclusive o tipo de recuperação secundária a ser desenvolvido que é usada quando você retira o petróleo. A pressão de dentro da rocha cai, então você injeta fluído, pode ser água, pode ser óleo, pode ser gás carbônico, pois você tem que saber as características dos reservatórios para que você possa fazer uma injeção, uma recuperação de pressão com eficiência. Por exemplo, no reservatório que tenha muita água não dá para injetar água. Se tiver muito gás, não se injeta gás, e assim por diante. Isso está sendo monitorado e até o final de 2010 deve entrar em produção um sistema piloto de Tupi, que terá 8 poços, 5 produtores de óleo e 3 de injeção de fluído. Até 2017 entrará em produção na modalidade de Teste de Longa Duração em todos os poços dos diversos blocos da Petrobrás.

Serão sete novos poços em produção, com o Teste de Longa Duração, já que cada bloco, teoricamente, tem sua característica. Mas espera-se que isso seja uma província contínua, porque não houve perda, não houve migração, o petróleo está todo ali. Então, espera-se que as características sejam bem próximas umas das outras.

Uma pergunta que sempre surge: se alguma empresa estrangeira furar fora do mar territorial (200 milhas) e encontrar petróleo, o que acontece? É dona? É dona. Só que não tem condições técnicas e nem comerciais de explorar o petróleo sem apoio logístico do Brasil. Imagine se montar uma infraestrutura de produção, tratamento e transporte de óleo a mais de 300 km da costa. É impossível técnica e comercialmente ter condições de isso acontecer. Esperamos até que tenha petróleo, mas ninguém vai investir. Aliás, só investiram no pré-sal depois que a Petrobrás descobriu. Aliás, a Lei 9.478/97 foi feita pra incentivar pesquisas em áreas novas, mas nenhuma empresa estrangeira colocou nenhum centavo em qualquer área nova, só nas que a Petrobrás já tinha pesquisado e devolvido.

Fernando Siqueira - Presidente da AEPET (Associação dos Engenheiros da Petrobrás) no Especial sobre o Pré-sal, publicado aos domingos em nosso blog.

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